No segundo dia do congresso da American Diabetes Association (ADA 2021), o epidemiologista do Imperial College London, Dr. Edward Gregg, fez uma brilhante revisão intitulada “Diabetes e Covid-19: impacto populacional após 18 meses”.
A apresentação teve início chamando a atenção para a grande variação de diversos aspectos epidemiológicos da Covid-19. Entre eles pode-se citar:
- Variação de 10 vezes nas taxas de incidência dentro dos EUA em um ano: de 15 por 1.000 por mês durante o pico, a 1,5 por 1.000 por mês durante o nadir;
- Variação de 100 vezes nas taxas de morte por Covid-19: de menos de 50 mortes em alguns países (Nova Zelândia, Vietnam, Tanzania), até 200.000 a
- 600.000 mortes em outros (EUA, Brasil, México);
- Variação de 10 vezes nas taxas de letalidade por país;
- Variação de 15 vezes no risco de hospitalização entre grupos de idade adulta.
Covid-19 e diabetes
Foi discutida ainda a relação entre diabetes e Covid-19, lembrando que, se por um lado as pessoas com diabetes têm pior evolução devido a várias condições
associadas, por outro o SARS-CoV-2, devido ao seu tropismo pelas células β, pode causar diabetes de início recente ou colaborar com a hiperglicemia na admissão hospitalar, conforme ilustrado na imagem abaixo.
Fonte: COVID-19 in people with diabetes: understanding the reasons for worse outcomes. Apicella MD et al. The Lancet. 2020.
Impactos da Covid-19
Também foi discutido de que forma a cascata de evolução da doença afeta não só a população de risco, ou a população afetada pela Covid-19, mas também a população geral.
Veja abaixo a representação esquemática apresentada pelo autor. A Covid-19 interfere de forma direta nos pacientes que sofrem a infecção, e de forma indireta nos serviços de saúde, estilo de vida/comportamento e saúde mental da população geral, assim como na economia, entre outros aspectos.
Fonte: ADA 81st Scientific Sessions (ADA 2021)
Impacto indireto nos fatores de risco e comportamento:
– Ingestão alimentar:
Registrou-se um aumento no consumo de frutas e vegetais e de refeições preparadas em casa, entretanto, também houve maior comer beliscador, número de refeições consumidas por dia, e ingesta calórica total. Houve um aumento de 40% no consumo de doces.
– Atividade física:
Houve um aumento nas atividades de lazer, mas aumentou o tempo sedentário.
– Peso corporal:
Aumento médio de 680 g/mês (baseado em autorrelatos do FitBit).
Conclusões
Em resumo, estudos epidemiológicos indicam, após 18 meses da pandemia Covid-19:
- Diabetes mellitus é um contribuidor central para evolução grave da Covid-19, e por outro lado, Covid-19 tem um efeito devastador na população com diabetes:
– Responsável por 30-40% das pessoas hospitalizadas, gravemente enfermas e mortes.
– Entre os casos hospitalizados com diabetes, cerca de 21 a 43% requereram cuidados intensivos.
– 25% de letalidade - Taxas de mortalidade geral foram 50% mais altas que tendências históricas, o dobro da população geral.
- Houve 20% de mortes acima do esperado
- Preditores chave de pior evolução incluem comorbidades como doença renal crônica, doença coronariana, insuficiência cardíaca, obesidade, descontrole crônico ou agudo de HbA1c.
- A maior parte dos dados epidemiológicos é baseado em informações de pacientes hospitalizados.
- Ainda há muito a ser esclarecido sobre os efeitos diretos e indiretos da pandemia, com todas as suas variáveis.
Mais do congresso:
- ADA 2021: quando iniciar novos antidiabéticos em pacientes internados por causas cardiovasculares?
- ADA 2021: qual o papel da hiperglicemia na evolução da Covid-19?
- ADA 2021: chegou para ficar? A telemedicina no cuidado do diabetes na “Era Covid-19”
- ADA 2021: tirzepatida – a nova droga potencial para controle glicêmico no diabetes
- ADA 2021: novos estudos com agonistas de GLP-1 para controle do diabetes.
Artigo publicado no Portal PEBMED em 27 Junho de 2021.
Autora: Daniele C. Tokars Zaninelli, endocrinologista em Curitiba.